A correria dos dias de hoje, a falta de tempo para o
diálogo, a comunicação cada vez mais intermediada por tecnologias, poucas
palavras precisam informar muitas coisas, ditam o ritmo da vida e quase sempre
a qualidade dos nossos relacionamentos. Neste contexto, algumas palavras acabam
perdendo o significado originário e são usadas para indicar outro sentido. A
palavra ladainha passou por este processo de transformação. É comum escutar
expressões como “lá vem novamente com a mesma ladainha” ou “aquela pessoas me
cansa com a ladainha insuportável de lamentação”.
A palavra ladainha vem do grego e significa súplica. É um
modo de oração suplicante, formada por invocações simples e breves, rezada nas
procissões penitenciais. A repetição lhe dá o tom de intensidade; é oração de
quem se encontra em situação de emergência e faz seu pedido com insistência,
simplicidade e confiança.
A repetição freqüente do Kyrie Eleison provavelmente foi a forma original da oração em forma
de ladainha, usada antigamente na Igreja da Ásia e de Roma. Um decreto do ano
529 dizia: “Deixe que o belo costume de todas as províncias do Oriente e da
Itália seja mantido (...) cantar com devoção o Kyrie Eleison (...), porque tão agradável e doce canto nunca poderia
produzir fadiga”. O número das repetições dependia do presidente da celebração.
No século V, as devoções cristãs começaram a se tornar
públicas e realizadas frequentemente com procissões, cantando títulos do Cristo
e invocações aos santos, especialmente nos dias em que eram celebradas as
festas pagãs. Por volta dos anos 590, quando uma epidemia devastou a cidade de
Roma, o então papa Gregório Magno exortou os cristãos de Roma à oração, numa
grande ladainha penitencial até a Basílica de Santa Maria Maior, para pedir
proteção. Na Igreja Oriental, a ladainha faz parte da celebração litúrgica. É
oração de intercessão e perdão baseada no salmo 50. A Igreja Latina canta a
ladainha dos santos nas solenidades e no rito do sacramento da ordem.
Orações em forma de ladainha são encontradas na bíblia. O
louvor das criaturas no livro de Daniel (Dn 3,51-90) é a ladainha mais
conhecida no antigo testamento: a criação se une num coro de louvor bendizendo
a Deus Criador; o salmo 148, nesta mesma linha, é uma repetição de louvores a
Deus pela criação: o salmista convida todas as coisas criadas a louvar a Deus;
também o salmo 136 convida o povo, em forma de repetição, a dar graças ao
Senhor “porque eterna é a sua misericórdia”. Este modo de oração coloca toda a
criação numa celebração litúrgica em que o homem reconduz as criaturas ao
Criador.
A ladainha é um modo de rezar que demonstra nossa comunhão
com Deus, com os irmãos da fé, que participam da plenitude da glória do Pai.
Recorremos a Maria dizendo títulos expressivos que nascem do nosso coração. É
um modo simples de rezar, carregado de confiança. Apesar de não compreender o
significado de muitas invocações, a presença, isto já é suficiente. Na oração
da ladainha, a beleza e a plenitude acolhem nossa miséria e confiança, na
invocação de nossos irmãos e irmãs de fé, que agora participam da plenitude da
glória de Deus, na recordação dos títulos e louvores que a Igreja dedica à mãe
de Jesus, em nossa abertura confiante à comunhão.
Padre Clemilson
Teodoro, missionário da Imaculada – Padre Kolbe.
Palavra de fé: “Senhor, ouvi minha oração, e chegue até vós o meu clamor”. (Salmo
101/102,2)
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