Encontro na 5ª
Avenida
Eu estava saindo da igreja de Saint Patrick, em Nova York,
quando um rapaz brasileiro se aproximou.
- Que bom encontrá-lo aqui – disse, sorrindo – Precisava
muito dizer alguma coisa.
Eu também gostei do encontro com um desconhecido.
Convidei-o para tomar um café, contei a chatice que foi minha viagem a Denver,
sugeri que fosse até o Harlem no domingo, para assistir um serviço religioso.
O rapaz, que devia ter vinte e poucos anos, me escutava
sem dizer nada.
Eu continuei a falar. Disse que acabara de ler um livro de
ficção sobre um grupo terrorista que toma de assalto a igreja de Saint Patrick,
e o escritor descrevia tão bem o cenário que me chamara a atenção sobre muitas
coisas que jamais havia visto em minhas visitas ao local. Assim, tomara a
decisão de passar por ali aquela manhã.
Ficamos quase uma hora juntos, tomamos dois cafés, e eu
conduzi a conversa o tempo todo. No final, nos despedimos, e desejei uma
excelente viagem ao rapaz.
- Obrigado – disse ele, afastando-se.
Foi quando eu notei que seus olhos estavam tristes; alguma
coisa tinha dado errada, e eu não sabia exatamente o que. Só depois de caminhar
algumas quadras foi que me dei conta: o rapaz se aproximara dizendo que precisava
muito falar comigo.
Durante o tempo que passamos juntos, eu assumira o
controle da situação. Em nenhum momento,
perguntei o que ele queria; na tentativa de ser simpático, preenchi todos os
espaços, não permiti um momento de silêncio, onde o rapaz finalmente pudesse
transformar um monólogo em diálogo.
Talvez ele tivesse algo muito importante para compartilhar
comigo. Talvez, se naquele momento eu estivesse realmente aberto para a vida,
eu também teria algo para entregar ao rapaz. Talvez, tanto minha vida como a
dele, tivesse mudado radicalmente depois daquele encontro. Nunca vou saber, e
não vou ficar me torturando com o fato de que não soube aproveitar um momento
mágico do dia; erros acontecem.
Mas, desde então procuro manter viva na memória, a cena da
minha despedida, e os olhos tristes do rapaz; quando eu não soube receber o que
me era destinado, tampouco consegui dar aquilo que eu queria, por mais que me
esforçasse.
Encontro no Posto
Seis
O padre José Roberto, da Igreja da Ressurreição no Rio de
Janeiro, saía certa manhã bem cedo, quando seu carro foi cercado por três
adolescentes.
- Passamos a noite em claro, padre – disse um deles, em
tom desafiador. – Pode imaginar onde
estivemos?
Como qualquer ser humano normal, José Roberto preferiu
ficar quieto. Imaginou o que significa uma noite em claro naquela idade, sentiu
medo pelos riscos que os garotos devem ter corrido, pensou na preocupação dos
pais.
O adolescente que iniciara a conversa terminou por
responder à própria pergunta:
- Ficamos na Igreja de N. Sra.Copacabana, adorando a
Virgem. Saímos de lá tão eufóricos que viemos caminhando até aqui
(aproximadamente 3 km.),
cantando alto, rindo, falando com todo mundo. Pelo menos uma das pessoas nos
perguntou: “como é que vocês, tão jovens, não têm vergonha de estarem bêbados a
esta hora da manhã?”
O padre José Roberto deu partida no seu carro, e seguiu em
direção ao seu compromisso. No caminho, se perguntou muitas vezes: “ Eu também
me deixei levar pelas aparências, e cometi uma injustiça em meu coração. Será
que algum ser humano vai finalmente entender a frase de Jesus, “vocês serão
julgados com a mesma medida com que julgam seu próximo?””
Paulo Coelho