quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Duas histórias reais na porta de uma igreja




Encontro na 5ª Avenida
Eu estava saindo da igreja de Saint Patrick, em Nova York, quando um rapaz brasileiro se aproximou.
- Que bom encontrá-lo aqui – disse, sorrindo – Precisava muito dizer alguma coisa.
Eu também gostei do encontro com um desconhecido. Convidei-o para tomar um café, contei a chatice que foi minha viagem a Denver, sugeri que fosse até o Harlem no domingo, para assistir um serviço religioso.
O rapaz, que devia ter vinte e poucos anos, me escutava sem dizer nada.
Eu continuei a falar. Disse que acabara de ler um livro de ficção sobre um grupo terrorista que toma de assalto a igreja de Saint Patrick, e o escritor descrevia tão bem o cenário que me chamara a atenção sobre muitas coisas que jamais havia visto em minhas visitas ao local. Assim, tomara a decisão de passar por ali aquela manhã.
Ficamos quase uma hora juntos, tomamos dois cafés, e eu conduzi a conversa o tempo todo. No final, nos despedimos, e desejei uma excelente viagem ao rapaz. 
- Obrigado – disse ele, afastando-se.
Foi quando eu notei que seus olhos estavam tristes; alguma coisa tinha dado errada, e eu não sabia exatamente o que. Só depois de caminhar algumas quadras foi que me dei conta: o rapaz se aproximara dizendo que precisava muito falar comigo.
Durante o tempo que passamos juntos, eu assumira o controle da situação.  Em nenhum momento, perguntei o que ele queria; na tentativa de ser simpático, preenchi todos os espaços, não permiti um momento de silêncio, onde o rapaz finalmente pudesse transformar um monólogo em diálogo.
Talvez ele tivesse algo muito importante para compartilhar comigo. Talvez, se naquele momento eu estivesse realmente aberto para a vida, eu também teria algo para entregar ao rapaz. Talvez, tanto minha vida como a dele, tivesse mudado radicalmente depois daquele encontro. Nunca vou saber, e não vou ficar me torturando com o fato de que não soube aproveitar um momento mágico do dia; erros acontecem. 
Mas, desde então procuro manter viva na memória, a cena da minha despedida, e os olhos tristes do rapaz; quando eu não soube receber o que me era destinado, tampouco consegui dar aquilo que eu queria, por mais que me esforçasse.   

Encontro no Posto Seis
O padre José Roberto, da Igreja da Ressurreição no Rio de Janeiro, saía certa manhã bem cedo, quando seu carro foi cercado por três adolescentes.
- Passamos a noite em claro, padre – disse um deles, em tom desafiador. –   Pode imaginar onde estivemos?
Como qualquer ser humano normal, José Roberto preferiu ficar quieto. Imaginou o que significa uma noite em claro naquela idade, sentiu medo pelos riscos que os garotos devem ter corrido, pensou na preocupação dos pais.
O adolescente que iniciara a conversa terminou por responder à própria pergunta:
- Ficamos na Igreja de N. Sra.Copacabana, adorando a Virgem. Saímos de lá tão eufóricos que viemos caminhando até aqui (aproximadamente 3 km.), cantando alto, rindo, falando com todo mundo. Pelo menos uma das pessoas nos perguntou: “como é que vocês, tão jovens, não têm vergonha de estarem bêbados a esta hora da manhã?”
O padre José Roberto deu partida no seu carro, e seguiu em direção ao seu compromisso. No caminho, se perguntou muitas vezes: “ Eu também me deixei levar pelas aparências, e cometi uma injustiça em meu coração. Será que algum ser humano vai finalmente entender a frase de Jesus, “vocês serão julgados com a mesma medida com que julgam seu próximo?””

Paulo Coelho

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